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sábado, junho 28, 2003

 

Ir ao Campera é como visitar um (mau) site da internet

Pensemos num site de internet. Tem uma morada que conhecemos, num formato familiar: www.site.com. Através desta morada acedemos ao seu interior. Utilizamos um meio físico para nos transportarmos, uns cabos telefónicos ou digitais. Meio esse que não vemos e que não tem qualquer outro fim senão transportar-nos para o site. Nessa viagem não paramos em nenhum sítio. Vamos directamente. E directamente acedemos ao conteúdo desse site. Esse conteúdo é totalmente livre. Quem o criou teve total liberdade para fazer o que lhe bem apeteceu. Se quis um background rosa-choque então assim seja. Não há constragimentos. Não lhe conhecemos o exterior. O lugar onde esse site está instalado é-nos indiferente, a não ser que torne a viagem mais lenta, ou mais cara. Tanto faz que este blog esteja alojado num qualquer computador da remota Tailândia ou que esteja no Brasil. Desde que cheguemos lá no mesmo tempo. Só la vai quem quer. Ninguém passa opor um determinado site a caminho de outro. A relação é directa. Se eu não quiser visitar um site qualquer, nada me obriga a visitá-lo. Como ficamos a conhecer um site? Através de um link, ou de uma publicitação num outro meio, ou através de uma pesquisa. Qualquer das maneiras implica um interesse objectivo, uma atenção especial.

Ora bem, ir ao Campera é em tudo semelhante.

Conhecemos a sua morada. A referência é uma saída da autoestrada. Essa autoestrada constituí-se como o meio de transporte. Á semelhança dos cabos electrónicos, a autoestrada não tem outro fim senão transportar-nos para o nosso destino. Ela vai a direito, corta caminho, constrói muros de protecção. Não tem nenhuma relação com a envolvente. Não paramos em lado nenhum. Nem olhamos para o lado. Metemo-nos no carro e só saímos no destino. Tal como o site, o conteúdo é que interessa. Ou se quisermos o interior. O exterior da coisa não existe, nem precisa de existir. E, uma vez lá dentro, perdem-se as referências exteriores. O Campera utiliza uma linguagem arquitectónica "típica" (o template) que vai buscar referências exteriores e abstractas. Também aqui há liberdade total. O mundo criado é completamente isolado. Foi uma construção típica portuguesa como poderia ter sido de inspiração havaiana. Vale tudo. O beirado artificial das suas lojas é um link para uma qualquer aldeia portuguesa. Também nos é indiferente se este outlet se situa no Carregado ou na Cruz Quebrada. Desde que exista uma autoestrada que nos leve lá num tempo aceitável ele pode existir onde quiser. Pois uma vez lá chegados impera o imaginário interior. É uma coisa autista. Também só lá vai quem quer. Quando vamos para o Porto passamos pela saída que dá acesso ao outlet. Mas nem lhe ligamos. É-nos totalmente indiferente. Não nos causa nenhum transtorno. Como descobrimos o Campera? Através de publicidade, de um aviso de alguém, ou de uma pesquisa em busaca dos preços baixos. Não se descobre por acaso, até porque apesar de estar perto da autoestrada (condição fundamental) passa despercebido.

Tal e qual um site da internet.

Isto é um fenómeno estranho. Estranho e assustador. É a negação da cidade como espaço de trocas e comércio. É a negação da arquitectura, pelo imaginário autista e falta de relação com a envolvente (também ela inexistente). É um sinal dos tempos. LAC
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