Contribuições, insultos, projectos de execução, mas principalmente donativos chorudos para:
Uma coisa está já provada: o Siza não é um deus. As enúmeras vozes que se têm ouvido levantam-se em nome da grega democracia bradando aos céus contra o uso do nome sonante para fazer passar uma ideia de si aberrante. O projecto não passará, com Siza ou sem Siza. Ainda bem. É sinal que realmente vivemos numa sociedade aberta. Não é preciso relembrar constantemente o 25 de Novembro, perdão, de Abril, para sabermos isso.
Há um argumento que ainda não vi esgrimido. Eu dou uma ajuda. Fala-se do interesse do grupo económico. Então e o interesse do velho Álvaro? Já repararam que ao seu currículo só falta(m) uma(s) torre(s)? Uma torre que prove que o mestre domina essa escala. Souto de Moura dominou o estádio, calando vozes que o acusavam de ser um arquitecto de doméstica proporção. Siza calará outras, dominando as alturas. Esta ideia não passa de uma tentativa do velho ancião para dourar o seu percurso, pontuando-o com a conquista dos céus, próprio dos deuses.
Mas deixemo-nos de teorias da conspiração.
1. Antes de mais o post que escrevi «
Que se lixe Alfama! Construam as torres do Siza» era sobretudo uma provocação. Ironia e provocação. Não pensem os meus amigos do
GANG que têm o monopólio sobre essa matéria. Mas não deixo de ser um adepto da construção em altura. E acho que nesta ideia de Alcântara a coisa enquadra-se.
Vamos por partes.
2. Não questiono opiniões técnicas. Se me dizem que as torres obstruem ostensivamente uma linha de escoamento vital para a cidade, só se fosse louco é que continuaria a suportar esta demente ideia. Mas para isso há técnicos louvavelmente qualificados. É ouvir e calar. Não conhecendo o projecto, só conheço como todos a imagem da maquete, duvido que seja esse o caso. Há uma irresponsabilidade mafiosa por trás dessa suposição que não me agrada.
3. Quanto à legalidade estou-me realmente nas tintas. Está aqui em cima da mesa mais uma ideia, um conceito, do que um projecto. E as ideias não se conformam pelas leis. O PDM? Também não é um deus. Dizer que a discussão é absurda pois tratam-se de edifícios de 30 pisos quando o PDM só permite 8 não vale nada. O PDM está a ser revisto. O PDM vai ser re-revisto no futuro. É a vida. A bem das conquistas de Novembro, perdão, Abril, tragam-se para a praça pública todas as ideias. Depois logo se vê.
4. Estou de acordo que Sousa Tavares se encontra preso a uma imagem emotiva, das taínhas e dos velhos. Não sei contudo a que cenário isso diz respeito. Sousa Tavares fala-nos de Belém. Parece-me que as torres não são bem aí. Parece-me, pois não conheço o projecto, só a foto publicada. Mas jurava que aquela coisa grande era a ponte 25 de Novembro, perdão, Abril. Gostava que me dissessem o que há ali a preservar na junto ao rio. Querem convencer-me que os barracões são já parte do património da imagem da cidade?
5. O sistema de vistas. Uma torre barra a vista do rio. Rouba autisticamente o cenário romântico. Ao ouvir isto só me lembro do comentário do senhor Pacheco de Melo, dono da casa Prémio Secil 2003. Dizia-me, quando questionado sobre a estranha opção de virar a sala para o interior do lote, em vez do maravilhoso Oceano Atlântico que banha a gloriosa ilha de S. Miguel, que de mar estavam eles fartos. Tinham-no a toda a hora. Não era uma questão central. Ainda assim sou muito sensível a este ponto. A «vista de rio» é uma mais-valia imobiliária fundamental. Por isso Sousa Tavares só admite construção em altura em pontos altos, criando assim uma espécie de anfi-teatro virado a sul, com as suas bancadas descendo em direcção ao rio. Não preciso de fazer um desenho para provar que aquelas torres não tiram a vista de rio senão a meia dúzia de pessoas. Se isto não for pacífico eu explicarei melhor.
6. Lembro-me de um fantástico editorial (como sempre) da Architectural Review, assinado por Catherine Slessor. Tinha por tema «Empreendimentos públicos». Antes, dizia, o povo tinha orgulho na sua cidade, nos seus marcos, nas suas conquistas. Sentia-se na legitimidade de obrigar o estado a gastar bem, construindo grandes equipamentos e projectos dinamizadores desse mecanismo de orgulho colectivo. As torres do siza não são projecto público. Mas deveriam ser objecto de orgulho bairrista de uma cidade. Pensemos na alternativa. O que se propõe, em termos de área total construída, equivale a 12 ou 13 edifícios de 8 pisos. Bonita visão esta.
7. Reconheço que se as torres não fossem do Siza estaria preocupado. Mas sinto-me com legitimidade para reclamar para mim essa preocupação. O simples conceito de construção em altura, numa cidade em que isso não é a regra, conota essa tipologia com um carácter de excepção, de ribalta. Democraticamente espero que se entregue essa responsabilidade a profissionais reconhecidos. Não quero nenhum Blody Chinese a construir aquilo.
Por isto e muito mais gostava, numa perspectiva romântica, de ver as torres construídas. Sonho com uma integração harmoniosa e valorizadora de construção em altura em Lisboa. Sonho com uma Lisboa «moderna». Sonho com a projecção de outrora restabelecida. Sonho com Lisboa. Sonho sobre Lisboa.
LAC
publicada por Lourenço Cordeiro #
12:03