[Muitos estudantes e profissionais sentem-se não só no direito como artistas individuais mas também obrigados a ser constantemente inovadores, provocadores, e críticos, se não mesmo espectaculares - em todas as escalas, desde o corrimão até à autoestrada. Apesar da preocupação com o edifício-objecto ser já antiga, a invenção da forma figurada deu recentemente lugar à invenção de campos abstractos, e na tectónica (ou a aparência de tectónica), especialmente superfície e pele, quanto mais liso e brilhante melhor. O choque do novo é hoje em dia ortodoxo e estranhamente conservador, exigindo cada vez mais energia. O conceito modernista transformou a audácia e a permanente mudança em fins em si mesmo, e não meios para um fim maior, ou a resposta a um problema. A invenção e re-invenção obrigatórias tornaram-se tão servis e previsíveis como os modernistas apregoaram em tempos acerca do ecletismo e historicismo das Belas-Artes. Liberdade para ser inventivo ou até mesmo chocante não é necessariamente sinónimo de ser livre.
A originalidade não é sinónimo de criatividade. Ambas requerem imaginação e engenho, mas a criatividade não é tanto sobre inventar do zero, mas mais sobre trabalhar dentro de um dado sistema. A imprevisibilidade e o acaso têm um lugar próprio, mas raramente há uma «luz no escuro». Os estudiosos do Talmude debatem há muito o significado da primeira frase da Bíblia - «No princípio Deus criou o céu e a terra.» Esta frase ainda desperta questões de interpretação sobre se Deus estaria a inventar do nada ou a organizar elementos já existentes de forma a dar-lhes ordem. Estamos ligados e em dívida com o nosso passado mais do que realizamos e estamos disponíveis a admitir. «... qualquer pessoa criativa é uma esponja em em negação,» para citar Robert Campbell. T.S. Elliot é mais abrupto: «O mau poeta pede emprestado. O bom poeta rouba.» É aceitável roubar e pedir emprestado, mas, nas palavras de John Habraken, devemos admiti-lo livremente e glorificar os nossos antecedentes. (Os escritos de Habraken, já agora, são dignos de louvor e eu admito sem rodeios que influenciaram este ensaio.)]
P.S: Já agora, e porque as coisas só têm sentido se as conseguirmos relacionar, lembro-me de um ensaio de Jorge Calado, que seguro agora nas mãos, intitulado «Em defesa da memória», onde às tantas se lê: «(...)O meu argumento é que a memória é o instrumento da detecção das semelhanças, isto é, a memória é a chave ou porta da Imaginação.(...)»
junho 2003 julho 2003 agosto 2003 setembro 2003 outubro 2003 novembro 2003 dezembro 2003 janeiro 2004 fevereiro 2004 março 2004 abril 2004 maio 2004 junho 2004 julho 2004 agosto 2004 setembro 2004 outubro 2004
Subscrever Mensagens [Atom]