O PROJECTO
Contribuições, insultos, projectos de execução, mas principalmente donativos chorudos para:
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quarta-feira, junho 30, 2004
dantesco
Reportagem da RTP, numa coisa chamada Fan Park:
«As pessoas aqui estão em aquecimento, literalmente em aquecimento.»
Prognóstico
A Holanda, meus amigos, não joga um cu. Dick Advocaat é, e não digo isto com leviandade, mais medroso e estúpido do que António Oliveira. Sim, desse também, mas falo de António Oliveira, aka Toni, ex-treinador do Benfica (pausa para chorar). Tem três dos melhores avançados do mundo: van Nilstelrooy, Roy Mackaay e Patrick Kluivert. Só um é que joga. Os outros não "encaixam". No meio campo enfia a trincalhada toda que tem. Nas alas, e atenção, é que reside o perigo. Principalmente o miúdo Robben. Os nosso sobressaltos virão desse lado. E a defesa? Mediana, meus amigos, mediana. Só Staam impõe respeito. Por estas e por outras é que eu digo: vamos ganhar facilmente. Resultado? 4-0. Mesmo assim. Quatro secos. Quatro. Secos.
Dizem-me que lá fora o sol brilha (3)
«Mas isso é giro»
Mas claro que é. Alguém duvida? Como se explicaria então os maus ordenados, as horas infindáveis de trabalho, as agressões físicas, o enxovalhanço da exposição pública? Como se suportariam os clientes, os especialistas, os emprenteiros? É a paixão, é a paixão. O grande problema é que isto é bom demais. É gratificante, é entusiasmante. Isto a propósito de uma breve explicação do nascimento de um projecto: o sítio, o programa, as áreas, os primeiros esboços. Quero levar luz até aqui, isto tem de caber ali, agora um corpo rasga isto, a circulação faz-se toda pelo exterior. «Mas isso é giro», disse, estranhando a minha angústia. Esse é o problema. A nossa angústia ninguém a compreende. Está claro que o resultado final se apresenta como evidente. Mas nunca o é. Jamais. A grande ingratidão. Como explicar o envolvimento emocional por um projecto? Não se explica, senhores, não se explica.
Como se pode ver
pelos últimos posts, o meu mal é sono. Até amanhã.
crise
O
photobucket está em baixo. Por momentos, este blog não tem nome. Quem somos? Oh, miséria. Preciso de um autocolante que me diga onde estou.
desabafo
Compatibilizar circuitos num edifício, meus senhores, é uma tarefa que torna a escolha de um primeiro ministro numa decisão elementar. Essa é que é essa.
terça-feira, junho 29, 2004
A minha solução:
Eleições antecipadas para Janeiro (não faço ideia o que acontece até lá, talvez um governo liderado por Manuela Ferreira Leite). Entretanto, o PS e o PSD fariam um congresso para escolherem os seus candidatos a primeiro-ministro. Porque, e convençam-me do contrário, Portugal não merece um governo liderado quer por Santana Lopes, quer por Ferro Rodrigues. Com sorte, Vitorino ganharia no PS e Santana perderia mais uma vez no PSD. Então, em Janeiro talvez, poderiamos ter eleições sérias. Porque a haver eleições em Setembro, elas nunca serão sérias e descomprometidas. Ferro em S. Bento? Tenham juízo.
Efémero?
A Feira do Livro acabou. Tudo foi desmontado, arrasado, empacotado, removido. Nada resistiu. Nada? Não. No alto do parque um intruso recusa-se a sair. Construído com materiais leves de carácter temporário, o café/bar (e também as estruturas dos auditórios) instalou-se para ficar. Sabe que não vai durar muito. O seu destino éstá traçado. Mas o normal seria já estar arrumado num canto. Mas não está. Porquê? O que levou um grupo de pessoas a interessarem-se por aquele espaço, temporário? Uma única razão: a sua arquitectura. Dirão: mas que raio tem aquilo de especial? De facto, não passa de uma estrutura temporária. Mas o cuidado e a serenidade com que se (im)planta no sítio conferem-lhe uma qualidade rara. Apesar de ser temporário. Os responsáveis são mais conhecidos pelo Lux. Quem tem escolhido o alto do parque para passar as noites, não desconfia da presença da mão de Margarida Grácio Nunes e Fernando Sanches Salvador. Não pensa muito nisso. Apenas se surpreende com aquele sítio, demonstrando desilusão pela desactivação anunciada para o final do Euro.
segunda-feira, junho 28, 2004
Dizem-me que lá fora o sol brilha (2)
Do nosso agente infiltrado
no OMA, aqui está Rem Koolhaas, com algo na mão (que se assemelha à Casa da Música), desfocado. Ele é tão rápido e virtual que nem a foto o apanha.
infanto-juvenil
Numa biblioteca o espaço infantil deve estar distante do espaço juvenil. À primeira vista, parece um contrasenso. Mas faz todo o sentido. Haverá altura em que a crise de identidade seja maior do que na adolescência? Se bem me lembro, e não foi há tanto tempo assim, o pânico e revolta por ser confundido com uma criança domina a mente de um adolescente a braços com o acne. Por isso, numa biblioteca, águas separadas. O assunto é sério. Uma simples decisão de projecto pode significar um trauma para o resto da vida.
O cantinho do euro-céptico
Esta situação toda baralha-me. Que eu não compreendia muito bem a Europa (a doze, a quinze, e muito menos a vinte e cinco) já sabia. Mas as reacções de quem supostamente a compreende a toda esta situação contribuem para o meu estado de confusão. Vamos por partes. A Europa, como união, existe para que os estados membros se entendam, e façam dessa união algo mais do que a soma das partes. Como tal, a Europa coloca-se um patamar acima dos interesses nacionais na hierarquia de prioridades. Acho que não digo nenhuma asneira. Acontece que, para a escolha do presidente da Comissão, apenas um nome parece reunir consenso entre os vários "blocos", ou grupos de interesse. Como não é fácil que todos se entendam, a simples existência de um nome que gera consenso deveria ser um facto de louvar, um acontecimento fundamental na vida europeia. Esse nome faz parte do governo de um pequeno país. Tudo bem. Será que Durão Barroso poderia dizer simplesmente "não"? "Passem bem"? Quando é reconhecidamente um europeísta? E aqueles que defendem a Europa, que louvam a Europa, porque se dizem "traídos"? Afinal, é só garganta, como diz o povo. Num momento crucial da vida europeia assobiam para o lado e defendem a recusa de Durão, devido a "interesses" nacionais. E os "interesses" europeus? E a divisão profunda entre o eixo Franco-Alemão e os Atlantistas? Não interessa? Pelos vistos, o "défice" português sobrepõe-se.
Repare-se que não me interessa a situação nacional. Ou melhor, interessa-me, mas não é para aqui chamada. Só demonstro a minha preplexidade pela capacidade que a Europa tem de desfazer um governo de um dos seus estados membros. Tranquilamente. Será isto sinónimo de "estabilidade"?
domingo, junho 27, 2004
Se estás como "cidadã", porque falaste nos arquitectos?
«Recebi 'pra aí umas 20 mensagens, mandei 'pra aí umas 40. Tenho aqui muitos colegas arquitectos. Estou aqui como cidadã.» (Helena Roseta, há 15 minutos, na manifestação, em directo para a SIC)
Helena Roseta não perde uma chance para associar a classe cuja ordem preside às suas iniciativas e opiniões político-partidárias. Sempre de mansinho, sempre com paninhos quentes, como quem não quer a coisa.
Dizem-me que lá fora o sol brilha
Uma seringa e um tubinho
Fado
Oiço Amália, cortesia do Público. Resignados que estamos com esta inevitabilidade constitucional, sendo que a alternativa poria Ferro Rodrigues em S. Bento, dedico, com alma e coração, estas palavras de O'Neill que Amália canta na faixa 10 ao dr. Santana Lopes:
Minuciosa formiga
Não tem que se lhe diga:
Leva a sua palhinha
Asinha, asinha
Assim deveria eu ser
E não esta cigarra
Que se põe a cantar
E me deita a perder
Assim deveria eu ser:
De patinhas no chão,
Formiguinha ao trabalho
E ao tostão.
Assim deveria eu ser
Se não fora não querer.
Vou acompanhando
a situação, aderindo às palavras do
Abrupto. É também uma alegria imensa notar o regresso do
Aviz a um ritmo aceitável. E é do Francisco o melhor post destes dias:
A CONSTITUIÇÃO VISTA DO BRASIL. O Prof. Jorge Miranda estava com um semblante mais do que carregado enquanto aguardava o seu voo do Brasil para Portugal ontem mesmo; ao vê-lo de passagem, num aeroporto, apeteceu-me consolá-lo: «Eu sei, professor, eu sei... A Constituição...».
sábado, junho 26, 2004
da ironia
Ainda não tinha percebido porque razão a esquerda tinha feito a festa "europeia". Sim, ganharam as eleições em portugal, mas, afinal, não passavam de eleições europeias. Na europa, porque é isso que conta, a direita voltava a vencer. Eis que tudo se clarifica. Com a vitória da direita na europa, a esquerda em portugal tenta meter o pé na porta e entrar à sucapa. Com a vitória da direita na europa, a esquerda pode chegar ao poder em portugal. E anda um gajo a ver se fica mais pró-europeu.
da análise
Artigo de Jorge Figueira (que, para quem ainda não percebeu, é uma das poucas pessoas que vale a pena ler) sobre Teotónio:
Da Arquitectura, da Alegria.
Santana Primeiro
Anda um tipo a ver se fica um pouco mais pró-europeu e fazem-nos uma destas.
sexta-feira, junho 25, 2004
É o que dá
ortografia
No último post tinha escrito
«sensação de desastre eminente». Corrigi, para o que queria realmente escrever:
«sensação de desastre iminente». Mas não sei se ficou mais correcto.
Só mágica
Seguro nas mãos o livro da Somague que celebra a construção dos seus estádios. Estádio do Dragão, Estádio do Bessa, Estádio de Leiria, Estádio da Luz, e o Estádio do Algarve. Pode dizer-se que a Somague é, em boa parte, responsável por esta proeza de não ter ocorrido nenhum atraso significativo. Não foi o único. Não me esqueço que, no dia da inaguração do Estádio da Luz, os enúmeros agradecimentos deixaram de fora a HOK Sport. Mas adiante. O que este livro me lembra é a dúvida permanente que assombrou o nosso país. A sensação de desastre iminente. Que tudo iria falhar. Vejo as fotografias das fases de escavações, fundações, primeiros arranques de pilares, a primeira bancada, a segunda bancada, esse momento entusiasmante da colocação da cobertura, a primeira cadeira, a segunda cadeira, o relvado verde. Fui acompanhando, à distância mas não só, o desenrolar do processo. Falava-se dos milhões, milhões gastos a despropósito. Eu consentia. Não valia a pena. Sabia bem do que o futebol é capaz. Hoje confirmo, ao ver gente que sempre ignorou e maltratou este desporto verter lágrimas e ranger dentes com os jogos da selecção. A construção dos estádios representou dois anos de inferno e angústia. A nós? Não. Àqueles que dia após dia viam o calendário apertar e as responsabilidades a pesar. Apesar de apenas um ser um projecto de arquitectura relevante (Braga), e outro representar uma mais valia urbana (projecto das Antas), a construção e remodelação em simultâneo de dez estádios num pequeno país como Portugal ficará marcada na história lusa. Pela capacidade de realização, pelos esforços financeiros (que confesso não entender de onde vieram), mas principalmente porque possibilitou a reconciliação do país com o futebol. Exagero? Não creio. Apesar dos pecados todos que carrega, o onze contra onze continuará a ser o grande gerador de mitos e heróis modernos. Pão e circo? Bom, neste caso é circo. E do bom.
Festejos
Ao ver a multidão na rua ganho um redobrado respeito pela teoria de Darwin.
«One man should accept most culpability here and he is the captain, David Beckham, whose third successive aberration from the spot placed his team-mates under so much pressure.»
«Sometimes it makes you wonder. Why do tens of millions of English people writhe in front of TVs, the families of the players suffer up in the stands, reporters try to attach a narrative thread to chaos and the 11 men who are actually out there carrying all those dreams around continue to believe that 38 years of waiting can end in glorious triumph?»
«The release from purgatory will not come. England have lost the keys.»
«These are the stopping points on the Lisbon rollercoaster, but they give no clue as to the traumas along the way.»
«By the time any England fan reads this dispatch, morning will have doubtless brought a terrible ache, either from a hangover or the effects of intolerable stress.»
«Since penalty shoot-outs were invented by some malign God who would be run out of town if he ever showed his face, the night ends with a festival of ritual cruelty - a scapegoating of the player who has to put his name to the final miss.»
Boa noite
«Boa noite a todos os que sobreviveram.» José Alberto Carvalho, ao abrir o telejornal, logo após o jogo.
quinta-feira, junho 24, 2004
Mano a mano
James vs. Ricardo: Por exclusão de partes, Ricardo recolhe o meu voto. 1-0
Miguel vs. Gary Neville: Um pode jogar também a central; outro pode jogar também a extremo. Previligiando o futebol de ataque, mais um ponto a nosso favor. 2-0
Ricardo Carvalho vs. Sol Campbell: Só Nesta e Cannavaro me faria tirar o ponto ao Ricardo Carvalho. 3-0
Jorge Andrade vs. John Terry: Hesito. Empato isto. 3-0.
Nuno Valente vs. Ashley Cole: Cole é magnífico. 3-1
Costinha vs. Gerrard: Bom, são muito diferentes. Pela contribuição para o colectivo, dou o pontinho ao Costinha. 4-1
Maniche vs. Lampard: Pela experiência, ponto para Lampard. 4-2
Figo vs. Beckham: Muito diferentes. Empate. 4-2
Cristiano Ronaldo vs. Rooney (a posição não é a mesma, mas impõe-se): Rooney, pelos 4 golos. 4-3
Deco vs. Scholes: Deco! Deco! Apesar de Scholes ser, sem a menor dúvida, o melhor jogador inglês da actualidade. 5-3
Nuno Gomes vs. Owen: Owen. Sem espinhas. Apesar da má forma. 5-4
Eis que Portugal leva uma vantagem ligeira. Está no papo, rapaziada!
Diário de optimista
quarta-feira, junho 23, 2004
traças e fachadas
Uma óptima contribuição, por mail, do
Classe Média, para a discussão dos últimos dias:
«Sucintamente, quem concretiza a arquitectura são os promotores imobiliários/construtores. Essa gente não "faz" arte, faz pela vida, e a vida faz-se com dinheiro. Desse prisma, há dois grandes motivos para manter fachadas: usar empenas muitos superiores às permitidas actualmente e tentar criar um produto dotado do horripilante mas valorizador "cachet".
No caso das empenas, o motivo é simples: o construtor/promotor vende metros quadrados, e metros quadrados em centros históricos são um bem (muito) escasso. Fazer um edifício com 30 m de fundo, por oposição a um com 13 m, pode compensar largamente o custo adicional de manter uma fachada, uma vez que a construção em altura está normalmente limitada aos pisos existentes. No fundo, é uma questão de volumes de construção, de contas.
Por outro lado, o "cachet" confere valor a um edifício uma vez que o diferencia aos olhos do comprador médio que não percebe nada da arquitectura. O peso da história, da tradição, a beleza clássica, é algo que está ao seu alcance. O comprador médio tem opiniões sobre cores e sobre a "nobreza" de materiais, mas não sobre a forma, sobre proporções. A vanguarda artística não lhe diz nada, e por isso mesmo, pode passar despercebida. Esse é um risco que pode assassinar um projecto (financeiramente, mais uma vez).
Ao estado, na sua função reguladora, cabe o papel de educador, e parece-me que o problema reside aí. A educação é de fraca qualidade e transmitida por gente manifestamente incompetente, mal formada e viciada. Desta forma, é impossível salvar o que merece ser salvo e renovar o resto, como podia/devia ser renovado.»
mete-lhe mais armadura!
João, tudo bem com a laje? Há 4 dias que o diário de obra não é publicado.
O que é a arquitectura? (11)
São os
despojos do dia, na batalha entre o Homem e o Mundo.
And she moves, she moves
Conselho Consultivo do Ippar Vai Analisar Torres de Siza para Alcântara
E claro, o que é que ele tem que eu não tenho?
Promotor Defende Tratamento Igual ao Alcântara Rio
Bom, e lá vem Pilatos passar água pelas mãos.
Santana Lopes Propõe Referendo "no Fim do Ano"
Chegando mesmo a dizer, mais à frente:
Sinto-me legitimado para tomar decisões como o túnel do Marquês ou o Parque Mayer.
E depois explica: mas no caso das torres, como não foi promessa, tenho de consultar o povo. Como diria a personagem de Al Pacino no «Perfume de Mulher», uh ahh!
terça-feira, junho 22, 2004
revelação
Reparo agora na curiosa sequência de posts. Dos dois últimos posts. E percebo. Tudo. Chego a casa e dá-me para escrever:
«Preciso que eles existam para os poder ignorar. Fazer de conta que não estão lá.» Passado isto, abro o hARDbLOG, e uma frase toca-me:
«A revolução começa ao saber que tu és meu irmão». Toma lá. Só não vê quem não quer ver.
compreendo
Ainda não tinha feito referência a isto, penso. Mas sempre que o João escreve sobre a sua condição de cristão, eu adiro. Pelo que leio, a minha posição é muito semelhante à sua. Com Fé, mas angustiado. E com muitas discordâncias "oficiais". Bom, isto para enquadrar esta citação, frases escritas hoje:
Viver não será fácil, viver segundo uma fé será mais difícil. Com a vida carregada de dúvidas e angústias que se costumam entranhar na alma de um cristão quando a noite vai alta.
Mas torna o acordar mais provocante.
A revolução começa ao saber que tu és meu irmão.
Vou repetindo,
a revolução começa ao saber que tu és meu irmão.
Vida quotidiana
Ando na rua. Ordeiramente, sem nada que me evidencie. Sou mais um na multidão. Passo por eles todos, cada um com a sua história. Mas a verdade é que não me interesso. Por nenhum deles. Não quero saber dos seus problemas. Das suas angústias. Das suas alegrias. Das suas desilusões. Mais: faço questão em não saber. Repudio-os. Mas preciso deles. De cada um, como é, diferente, único. Preciso de partilhar a escada rolante do metro. Preciso de estar ao seu lado na passagem de peões. Preciso que eles existam para os poder ignorar. Fazer de conta que não estão lá. Preciso de ignorar. E só a cidade me dá isto. A possibilidade de ignorar.
geração rasca
«
Kalkito» de Pedro Lomba:
«NO CENTENÁRIO DE BLOOMSDAY O romance modernista é filho de James Joyce e de Thomas Mann. Joyce deu-nos o culto da forma e da experimentação. Mann é o pai do romance-ensaio: os seus livros são uma salada de filosofia, ciências e literatura. Eu li apenas, timidamente, alguns capítulos de Ulisses. Ulisses tem a prosápia mas, sobretudo, a avassaladora erudição de Joyce, que usou Homero, Dante, Shakespeare e a sua formação jesuítica. Não é o livro que é ilegível; o ensino secundário é que acabou connosco.»
segunda-feira, junho 21, 2004
brits
Em Albufeira, a ralé do turismo britâncio grita: «We're not going home, we're not going home». Eu digo: «Oh yes you are, just wait until thursday.»
Siza no Chiado
A correr porque estão a começar os jogos de hoje. Prometo voltar ao tema. O
João lembra a experiência (falhada ou parcialmente falhada) de Siza no Chiado. O que tem piada, pois ainda hoje discutia os dois exemplos do Siza no Chiado: o Terraços e os Armazéns. Já o
Pedro, e fazendo uso da sua experiência (que trago à baila para lembrar quem lê que deste lado fala um imberbe inexperiente), ataca violentamente a obra que elogiei mesmo aqui em baixo. Bom, devo dizer que não defendo que, para aquele lote, fosse imperativo construir uma coisa contida, calma, serena, e integrada. Apenas quis dizer que se há preocupações principalmente ao nível colectivo e comunitário de fazer algo
integrado, é possível fazê-lo sem comprometer uma ideia de contemporaneidade, sem recorrer à cópia da "traça original". E aqui discordo com o que é dito pelo Pedro. Não acho que fosse preferível
«ir aos arquivos municipais e copiar a traça de um pombalino original». Mas não me importava de ver ali nada do Nouvel, ou do Gehry, ou do Graça Dias. E lá se iria a "integração". Mas voltarei ao tema, isto promete. Agora, se me dão licença, vou descobrir quem vamos cilindrar nos quartos de final.
P.S.: É muito bom, sim senhor, ver a blogosfera a discutir entusiasticamente. Que saudades tinha. A malta do costume que opine também.
Integração
No
hARDbLOG e no
Planeta Reboque continua-se a conversa. Traça original, integração, história. Querem ver como se faz, em vez do exemplo que aqui referi? Passem pela rua do Alecrim. Do lado esquerdo de quem desce. Terraços de Bragança, nome pomposo dado ao projecto de Siza Vieira. É um cliché? Um tema recorrente? Uma adoração a um nome intocável? Não. O projecto de Siza Vieira está como deveria estar. Calmo, sereno, bonito. Integra-se na perfeição. Sem se impôr, com uma métrica de vãos correctíssima, materiais sóbrios, uma geometria contida e actual. E dá continuidade ao ritmo da rua que desce ao Cais do Sodré. Sei que há quem não goste. Quem se tenha desiludido. Eu não me canso de elogiar o homem. É que a sua sabedoria não vai durar para sempre.
Por-tu-gal
Uma da manhã. Chego a casa, depois da vitória de Portugal sobre a Espanha. Janto num restaurante indiano no Bairro Alto, ao lado de alemães e em frente de italianos. Nas ruas, festeja-se a vitória, a vitória do campeonato. Ai não é o campeonato? Não, ainda falta. Não faz mal, festeja-se já por causa das coisas. Partilho a emoção. O país precisa. O sr. Scolari também, depois da confissão que quer ir para casa «dar um abraço na mulher», apesar de não saber se vai «ter tempo para outras coisas.» Nuno Gomes, a padeira de Aljubarrota. A Aljubarrota do séc. XXI, entenda-se. Buzina-se. Bebe-se. Muito. O homem do jogo? Ricardo Carvalho. Sem ele nada feito. Belo golo. Agora que venha a França. É o que desejo. Temos contas a acertar desde 2000. Mais nada.
domingo, junho 20, 2004
mailbox
Há vida na mailbox:
(...) não queria deixar em branco alguma desconfiança relativamente
a algo que afirmas no post "popular e erudito"...
não sei bem por onde começar mas parece-me que confundes umas
quantas ideias e lugares comuns perigosos.
popular = folclórico, imutável, inexistência de uma consciência crítica, ...
erudição = crítica, consciente, reacção, ...
é necessário que se saiba um bocadinho melhor que se quer dizer
com uma e com outra palavra (e serão as melhores? será popular = a tradicional e
= a vernáculo? sim? não? e erudito que é realmente? arquitectura de
arquitectos? arquitectura de arquitectos eruditos?).
só deixo perguntas mas creio que é por onde devemos sempre começar
e não esquecer nunca de as voltarmos a fazer. (...)
(Patrícia Santos Pedrosa)
A discussão, apesar de não o ser, continua aberta.
O presente está passado
«O Instituto Português do Património Arquitectónico impôs a manutenção da fachada do prédio e que a construção obedecesse à traça original.»
Sem rodeios, directos ao assunto: isto é um belo disparate.
Eu percebo o IPAAR. Ou melhor, não percebo, mas finjo que percebo, para tentar iludir-me sobre este tipo de situações. Mais à frente no texto diz-se
«(...) tendo havido a preocupação em recuperar o desenho antigo e integrá-lo de forma harmoniosa na área envolvente nesta zona cheia de história.» Devo confessar que ainda não sei bem por onde pegar. Vamos, então, tim tim por tim tim.
Da primeira frase:
«impôs»: acho bem. O IPAAR serve para impôr. Nada a dizer.
«manutenção da fachada do prédio»: passando por cima da palavra «prédio», o que isto quer dizer é que não se podia demolir o existente. Que isso se interprete pela simples
«manutenção da fachada», como se isso deixasse vivo alguma coisa, é mais grave. Adiante.
«a construção obedecesse à traça original»: porquê? Pergunto, porquê? Repito, porquê? Olhem bem para o resultado final. Já está? Primeiro, onde está a
«traça original»? Segundo, porquê tanto medo? Vale a pena continuar a observar a imagem. O que vemos? Vemos um edifício partido em dois, com um corpo à direita que corresponde ao «original, recuperado e amarelo, e um corpo à esquerda, novo, aberrante. Aberrante? Sim, aberrante. À primeira vista, e num folhear de página distraído, parece tudo a mesma coisa. Mas um olhar menos parvo começa a indignar-se. Repare-se como nem a métrica das janelas se manteve! No novo corpo o espaçamento é bastante mais reduzido. Depois, este vidro medroso (não merdoso, medroso), escondido, mas vidro, porque é moderno. E entrou-se numa loucura demente: quer dar-se um ar de "moderno", catita, novo, mas tudo é feito com o rabo entre as pernas, mantendo a
«traça» original. E o pilar, meu Deus! Aquele pilar de canto, o que é aquilo? De onde veio? Onde aterrou? Bem, não me vou chatear mais com isto.
«obedecesse à traça original»: primeiro, não obedece. Depois, o que é
«obedecer à traça original»? Depois, porque razão tem de
«obedecer à traça original»? Só encontro uma explicação: medo do contemporâneo, um medo comercial e despropositado. Mas lembro, tudo com a conivência do IPAAR.
Vamos à segunda frase:
«recuperar o desenho antigo»: bom, desde que não se deite abaixo, o desenho está lá sempre. Pode recuperar-se a construção, os materiais, os remates, muita coisa. O desenho não. Ou está lá, ou não está. Mas eis que uma negra nuvem cobre o sol. Será que o processo de
«recuperação do desenho antigo» diz respeito à nova construção? Não, não pode ser.
«integrá-lo de forma harmoniosa»: e, neste ponto, já sabemos qual a única maneira de
«integrar» qualquer coisa. Isso mesmo, fazendo igual. Com o rabinho entre as pernas tremendo que nem varas verdes. Mas lembro que isso nem foi conseguido. Sejamos sérios: ou se perdia a vergonha toda e construía-se exactamente segundo a
«traça» e as técnicas originais(ainda que mesmo que fosse em betão ninguém repararia), ou se fazia alguma coisa de jeito, sem medo, com arquitectura, usando uma linguagem de hoje, tornando esta coisa naquilo que verdadeiramente é: um edifício em dois tempos.
O título do artigo (?) que acompanha esta imagem, num suplemento pindérico do Expresso, diz o seguinte:
«O passado está presente». Pois bem, pela amostra, parece-me que é exactamente o oposto.
sábado, junho 19, 2004
Teotónio e Carrilho
O «Actual» desta semana dá destaque a dois arquitectos: João Luís Carrilho da Graça, a propósito da atribuição do prémio Luzboa-Schréder, e Nuno Teotónio Pereira, a propósito da inaguração na próxima sexta-feira de uma exposição sobre a sua obra, no CCB. São dois nomes incontornáveis, pertencentes a gerações diferentes. Teotónio é o grande nome do modernismo português de Lisboa, um dos homens que introduziu no país Corbusier e a sua Carta de Atenas. Carrilho é filho dos períodos conturbados de 1974, época em que sai da ESBAL. Devo dizer que admiro muito a obra dos dois. Mas por razões diferentes. E isso é que importa.
Teotónio Pereira é um puro. Um homem de causas e ideais, que viveu num tempo que permitia essas causas e ideais. Isso reflecte-se na sua obra. O seu atelier, o famoso atelier da Rua da Alegria, sempre foi uma coisa colectiva, sabendo ir beber da experiência e contribuição de todos os que por lá passaram (em especial Bartolomeu Costa Cabral, Nuno Portas e, mais recentemente, Pedro Botelho). É um percurso marcado pelas intervenções sociais e religiosas. Betão à vista, madeira, 45º, baixos relevos, intervenções artísticas de convidados, um grande sentido comunitário. A sua obra não é "bonita", no sentido de uma estética de imagem. Nunca se rendeu ao facilitismo da retórica, do reconhecimento público, do nome. É um resistente, um lutador calmo e sereno. Basta entrar na Igreja do Sagrado Coração de Jesus, em Lisboa, para imediatamente se perceber como encarou Teotónio a arquitectura.
Carrilho da Graça representa o arquétipo que muitos têm de um
arquitecto. Eu não gosto dele. Da pessoa. Mas reconheço que não o conheço. Ainda assim, Carrilho da Graça é um meticuloso gestor da sua imagem. E não falo só do que veste e calça (que chama sempre a atenção). Falo do que diz, como diz, quando diz. É arrogante, distante, frio. É uma estrela. Ao contrário de Teotónio Pereira, o seu percurso é fortemente individual (no que respeita ao modo de trabalhar). É também um virtuoso do espaço. Se pode haver poesia na matéria construída, ela está presente na obra de Carrilho da Graça. A interpretação que faz dos sítios, do programa, da linguagem moderna, resulta quase sempre em lugares de silêncio e contemplação, mas interpelativos e actuantes, não demissionários. Ao contrário de Teotónio Pereira, as suas obras brilham nas páginas de revista. Pedem para ser fotografadas e mostram claramente como devem ser fotografadas. A obra de Carrilho assume sem rodeios essa atitude.
Estes dois homens podem simbolizar apenas duas gerações diferentes, e simbolizam-no claramente. Mas há mais. Personificam duas grandes áreas de actuação da arquitectura: o campo social e humano; e o campo artístico e conceptual. Não digo que são exclusivos, mas normalmente é isso que acontece. Interessante é perceber que isso se reflecte (ou nasce) na postura pessoal do arquitecto, na sua imagem, no seu tratamento na imprensa.
Irei ver com prazer a exposição de Nuno Teotónio Pereira. Ver e aprender, porque homens destes começam a escassear (lembro a morte recente de Vítor Figueiredo, por exemplo). Daqui a uns anos veremos onde chegou esta outra geração, a de Carrilho da Graça. Mas duvido que ocupem tantas páginas na história da arquitectura em Portugal. Duvido.
professor
Anticonstitucionalissimamente
Temos Constituição. Não vou opinar sobre isso. Faltam-me conhecimentos e um sentido do politicamente correcto. Mas há coisas que me inquietam. Um dia antes da aprovação da Constituição, Chirac vetou o nome de Chris Patten para presidente da Comissão Europeia por este não falar francês. É o delírio. Lá porque os gauleses andem amuados e chateados com a sua culta pátria, isso não significa que possam fazer birras. O que virá a seguir? Portugal pode vetar um nome porque este não sabe o cantar o malhão malhão? Espanha pode mandar de volta um presidente por este não gostar de tapas?
Mas confiança. Temos Constituição.
sexta-feira, junho 18, 2004
Chico
Aqui fica a minha contribuição para a
semana buarqueana, com esta belíssima
Construção:
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acbou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado
«Construção», Chico Buarque, 1971
Very typical
Agora que o país está mergulhado em gentes da Europa (que ao que parece aprova hoje a sua Constituição), as ruas e os cantos transformaram-se em postais «very typical». Eles não querem ver só futebol. E passeiam-se. Com os olhos de quem vem de fora, à caça de pormenores pitorescos, «very typical». Porque é que isto me incomoda? Portugal pode (e isto não é independente da aprovação da Constituição) descobrir que o seu maior valor reside nos cantos «very typical». Já escrevi sobre isto algumas vezes. Mas agora, com o manto verde estendido de norte a sul coberto de bifes, a coisa torna-se mais evidente. Eu sofro. Como quem antecipa sempre o pior.
sobre o mesmo tema:
A Europa, Portugal e o Património Cultural
«Patriotas»
Não deixem de ler o artigo de Miguel Sousa Tavares hoje. É tão bom que o
Público não o disponibiliza on-line (provavelmente é uma gralha).
quinta-feira, junho 17, 2004
A administração da EPUL
foi toda com os patins. Pela amostra que tive uma vez não admira. Era um director de um departamento qualquer. Perto dos cinquenta, baixo, vestido a rigor com um relógio desses modernos a armar ao jovem. O seu discuro foi sofrível. Fez da EPUL, ali, naquele momento, a empresa responsável por todo o urbanismo de Lisboa. Quis impressionar mas acabou por expôr toda a sua ignorância. Coitado, não fazia ideia para quem falava. Não fazia ideia da sua figura. Parecia feliz.
«Os jovens arquitectos, às vezes, só à chapada», disse por entre sorrisos, como quem diz uma piada para desanuviar o ambiente. De repente, mostra uma folha pindérica com umas imagens de "media" do projecto do Parque Mayer. E sai-se com esta pérola:
«Estão espantados, não estão? Há uma semana não tínhamos material para apresentar na feira de Barcelona», dizia orgulhoso,
«e bastou um mail da minha secretária para o atelier do Gehry para que 10 minutos depois tivesse no meu computador essas imagens.» Coitado, parecia tão feliz.
«Sabem onde é o atelier dele?», perguntou como quem está convicto de possuir um trunfo na manga.
«Los Angeles», disse eu, farto daquele banha da cobra. O seu semblante deixou cair o sorriso idiota para revelar que
«sim, também há esse, mas eu referia-me ao de NY» Coitado, parecia tão feliz, nem sabia que o Gehry tinha um atelier em LA.
Resumindo: um incompetente. Um vendedor completamente iludido, convencido que faz(ia) urbanismo. Mas parecia tão feliz.
popular e erudito
O que os separa verdadeiramente? Na essência, o que difere? Podemos dizer: a erudição pressupõe conhecimento (mas digo: o popular também); a erudição revela cultura (mas digo: o popular também); a erudição é, espera-se, bela (mas digo: o popular também); a erudição é atenta e crítica (e digo: o popular não).
Esta atitude crítica faz toda a diferença. A consciência do gesto é tudo. Não se trabalha para a interpretação superficial; nem tudo o que é tem de parecer. É uma iteração constante, de referências várias. Piscadelas de olho, ataques violentos, elogios subtis. A erudição faz-se por reacção.
O saber popular é pragmático e folclórico. Revela sedimentação, uma acumulação de experiências. É empírico e imutável. Daí o
tradicional. Quem faz não revela a sua unicidade. Não interessa a interpretação devido à inexistência de uma consciência crítica. O seu valor provém do tempo, das camadas sedimentadas. É extremamente coerente.
quarta-feira, junho 16, 2004
Adeus Luciano
O
Comprometido Espectador acaba no dia que faz um ano. Só por isso não leva felicitações. Toma.
Um ano d'Aviz
Parabéns
Francisco. Já me tinha esquecido que o
Aviz foi companheiro de jornada. Começou dois dias depois desta humilde casa. Claro que o Aviz não teve o mesmo impacto que este blogue teve mas, caro Francisco, não se pode ter tudo. Um abraço.
Treinador de bancada
Moreira; Nuno Valente, Ricardo Carvalho, Jorge Andrade, Paulo Ferreira; Costinha e Petit; Simão, Deco, Figo; Pauleta.
Depois digam quanto é que ficou. Não vou poder ver o jogo. Já disse que não vou poder, não perguntem porquê. Mau, já me estou a chatear. Mudemos de conversa, sim?
Balões e serpentinas
Obrigado ao
Classe Média, ao
Lutz (less is also sometimes more), ao
Pedro (a companhia é mútua) e ao
Daniel (ainda estou a pensar nessa da Rotring...) pelas simpáticas referências. Nunca pensei que isto durasse um ano, nunca pensei que fosse ter tanta e tão boa companhia. O único travo amargo? Não ter conseguido transformar o blogue numa coisa verdadeiramente colectiva. Mas tentei e continuo a tentar. Um especial obrigado a todos os que durante este ano enviaram e-mails tornando a experiência muito mais rica e interessante. Venha mais um!
terça-feira, junho 15, 2004
capitalismo
Sempre vagueio pela livraria da Ordem dos Arquitectos arrependo-me de não dar mais importância ao vil metal.
inside
É um privilégio podermos contar com estas
Notas Europeias.
segunda-feira, junho 14, 2004
A ponta já não é a pontinha, ou a pontinha é que já não é a ponta
Lisboa transformou-se. Acabou uma era. O tempo em que a linha azul terminava na Pontinha. Pontinha, numa palavra cabia toda uma mitologia. A Pontinha que era a pontinha da linha, no fim de percurso, nome que indicava uma das direcções (sendo a outra a Baixa/Chiado). A linha azul era perfeita, com dois topónimos limites de uma poesia inigualável: começava na Baixa e acabava na Pontinha. Isto sim é uma linha de metro! Chamando os bois pelos nomes. Ao longo dos tempos, a Pontinha fez as delícias de muito humor. A Pontinha é, mesmo que não exista, uma instituição. Do trocadilho nacional que bem gostamos, um imaginário brejeiro e fácil. A linha azul acabava na Pontinha. Agora acaba numa triste "Amadora Este". Amadora Este? Vão mas é para o ...
Pormenores da estrelinha (2)
No Manifesto para as Europeias ficamos a saber que o Miguel vai defender
«A dissolução das alianças militares, em particular da Nato».
Pormenores da estrelinha (1)
Na página oficial do
Bloco de Esquerda trata-se o visitante por "tu".
1 ano
O PROJECTO, um ano. Por enquanto, é para continuar. Celebremos. Bom dia!
Breve explicação do acto
Era uma vez umas eleições europeias. Nestas eleições, o povo decidia quem representaria o seu país no Parlamento Europeu. O Parlamento Europeu é um sítio onde, democraticamente, os 25 países membros votam concensos. Num pequeno país as eleições correram sem sobressaltos. Com um governo constituído por uma coligação dos partidos de centro-direita, coligação necessária para uma maioria absoluta que se impunha após a fuga do centro-esquerda, Portugal atravessa tempos de recuperação. Recuperação que custa sempre, pois são necessários alguns esforços. Ora o povo, que não é nada parvo, sabe que só ele faz esses esforços; a classe "alta" está escusada, pois tem "posses". Durante a campanha não se falou da Europa, só do país. Bom, houve algumas entrevistas onde foram abordados alguns temas, mas nos comícios da TV só se viu insultos e comentários sobre a política interna (com a excepção da guerra). Quase no final da campanha, o cabeça de lista do maior partido da oposição, vencedor anunciado das eleições, viu a sua vida acabar de uma forma abrupta, que comoveu o país. Um antigo presidente da República e desse partido, chamado Mário Soares, disse no dia da morte de Sousa Franco que a melhor maneira de respeitar a memória do professor seria votar na sua lista. O povo, que não é nada parvo e respeita o dr. Soares, obedeceu. Houve outro facto que pesou: o nome da coligação. A coligação armou-se em esperta e decidiu intitular-se «Força Portugal», numa clara alusão ao futebol, pois nesse país decorre o campeonato europeu de futebol. A selecção da casa até jogo no dia antes das eleições, o que poderia ser bom para a coligação. Mas não foi. Portugal levou uma abada dos Gregos e subitamente o cachecol que diz «Força Portugal» passou a ter um sabor amargo. A coligação lixou-se. Entretanto, no mundo dos pequenos partidos totalmente irrelevantes, houve uma estreia. O Bloco de Esquerda, que é um movimento formado por partidos um bocado esquisitos, elegeu um deputado, sem que se lhe reconheça alguma ideia "europeia". Os comunistas mantiveram a sua dupla, adiando a agonia da morte por uns tempos. Ah, e também havia um partidozito chamado Nova Democracia, mas esse deve ter-se perdido no caminho, pois ninguém o viu. E então, o que sai disto? Sai que a esquerda faz a festa e Ferro Rodrigues será o próximo canditado da oposição a primeiro-ministro. Claro que ninguém acredita que Ferro Rodrigues será primeiro-ministro de Portugal, mas o melhor é deixá-lo estar sossegado. O dia hoje é de festa. Para a esquerda. Uma vitória moral.
domingo, junho 13, 2004
Crónica do exercício de um dever
Já está. Cruzinha feita. Não votei em branco, o nobel que me perdoe. Que me perdoe duplamente, não tendo eu contemplado com a cruzinha a lista a que o senhor pertence. Que me perdoe triplamente, não tendo conseguido eu ler nenhum dos seus escritos. Por outro lado, devo perdoar a junta, de freguesia. Para exercer o meu direito (ou dever?) sou (eu e todos os outros) convidado a subir dois andares, a pé, que nunca fez mal a ninguém. No estreito corredor do edifício na rua da Imprensa Nacional, cruzo-me com um eleitor já de seu direito (ou dever?) cumprido, nada mais nada menos do que o presidente do Sporting, de pólo verde como não poderia deixar de ser. «9466, Lourenço Ataíde Cordeiro», «confirma», «confirma». Fico sempre maravilhado a contemplar o boletim de voto, descobrindo movimentos e associações que a memória já se treinou para ignorar. Parafraseando Rui Reininho, «já nem sei em quem votei», apesar de saber muito bem em quem votei. Devo dizer que tudo me pareceu decente. As pessoas na rua, cruzando-se, guardando ou retirando os BIs e os cartões de eleitor, num processo muito cívico. Olho para as suas caras e tento adivinhar em quem votaram. Um sujeito carrancudo, baixo, zangado com a vida. «PS?» Um homem de cabelo lavado, bom aspecto, bronzeado e sorridente. «Força Portugal». E assim foi, escrevo estas linhas à espera do fim da tarde, à espera da Constança, do Miguel e do Marcelo na TVI (a SIC poderia fazer-nos o favor de voltar a juntar António Barreto e Pacheco Pereira, como nos bons velhos tempos). Estou tranquilo. Já votei.
no comments
populares
Apesar de haver gente a mais, claramente gente a mais, cumpriu-se mais uma madrugada de doze para treze. De Junho, está claro. Com muito calor na pele, Super Bocks e jarros de sangria, subindo e descendo as apinhadas vielas de Alfama. No fim da noite subiu-se a rua do Alecrim, pegando com a rua da Misericórdia, inundados por um cansaço que anunciava um sono profundo.
sábado, junho 12, 2004
Portugal positivo
Hoje, no
Mil Folhas:
«"Prototypo" Escreve-se com "O" no Fim
Ana Vaz Milheiro
Lia-se, no primeiro editorial da "Prototypo", revista de cultura arquitectónica e artística, que esta fora "imaginada como uma análise de temas contemporâneos, convocando artistas, arquitectos e pensadores num universo interdisciplinar que os reconhece como produtores de cultura, para além do que é específico nas suas práticas". O "objectivo Prototypo" iniciado em 1999 pelos arquitectos Diogo Seixas Lopes e Paulo Serôdio Lopes e pelo "designer" gráfico Pedro Rufino propunha descolar numa viagem com destino, cujo mapa, se porventura poderia merecer dúvidas aos seus potenciais leitores/interlocutores, estava perfeitamente definido pela equipa editorial. Havia, previamente, um prazo de validade circunscrito ao "nome", com paragens que obedeciam à sucessão cadenciada de nove letras: P, R, O, T, O, T, Y, P, O.
A ter-se assistido a algum milagre, este residiu no facto de a equipa ter conseguido - com flutuações de qualidade - chegar convicentemente ao último "O" da palavra "Prototypo". Não foi por acaso: a partir de um dado momento, persistência também foi sinónimo de "Prototypo".
(...)
Estava em causa fazer uma "revista de arquitectura" competitiva, não exactamente com vista ao "mercado nacional" - o que não fazia qualquer sentido, nesse Fevereiro invernoso de 1999, dada a ausência de "concorrência" interna pela escassez de publicações especializadas -, antes se apostava numa internacionalização. Construiu-se uma proposta editorial que passava pela conjugação do "assunto tratado" com a imagem ou o grafismo. Desde logo, a presença de um sinal visual ou plástico muito forte tornou-se estrutural.
(...)
Curiosamente, na "Prototypo", os seus editores, que também colaboram noutras propostas editoriais através do exercício da crítica (caso de Diogo Seixas Lopes), optaram sempre por se remeter ao silêncio. Confiaram (prudentemente?) na eloquência das recriações a que a revista se foi entregando. "Agora vou-me", escreve Drummond de Andrade em "Canção Final". É tempo de recomeçar.»
1084-2004
Hoje, pendura-se na varanda de casa a primeira bandeira do Conde, as cores do Conquistador, os Afonsos e os Joões, a brancura dos Descobrimentos, D. Sebastião que se empresta aos Filipes, a riqueza de D. João VI, a "monárquica" do Liberalismo, e o verde-rubro da República. São quase mil anos à janela, como se nada fosse.
sexta-feira, junho 11, 2004
«jovem»
Tenho aquela idade que provoca uma dislexia momentânea nos meus interlocutores. Dependendo de algumas variáveis (a saber: indumentária, atitude, companhia, local, hora do dia, entre outras), sou abordado por «senhor» ou por «jovem»; tratam-me por «tu» ou pela formal terceira pessoa, transparecendo sempre uma inevitável hesitação. A minha existência é líquida. O que, convenhamos, é o suficiente para viver numa constante crise de identidade.
pormenor
O céu, como vês, não é todo azul.
Typeface
Entre a palavra e o leitor apresenta-se um comprometido intermediário: o tipo de letra.
É a loucura.
títulos
Fenêtre en longueur, expressão de Le Corbusier para descrever a sua janela. Um dos cinco pontos,
Les 5 points d'une architecture nouvelle, de um tempo que marca uma nostalgia de algo nunca vivido, quando ainda fazia sentido mandar para as estampas manifestos convictos. E, simultaneamente, é também um dos muitos títulos que deveria ter dado a este blogue. Como
Complexidade e Contradição, por exemplo.
quinta-feira, junho 10, 2004
Last Action Hero
Jorge Calado, o professor Jorge Calado, foi uma das pessoas que maior honra tive em conhecer, em ter sido seu aluno. Um pedagogo exemplar, rígido e exigente, comunicativo e entusiasmado. Com conhecimentos enciclopédicos, seduz quem o ouve com a sua paixão pela cultura. Por «Uma Cultura», em oposição às «Duas Culturas» de C. P. Snow. Defende, e convence, que entre a Ciência e as Artes nada há que distinga. «O espírito criativo» é o mesmo. Passa, no mesmo discurso, facilmente do princípio da incerteza para Pollock, de James Joyce para Bresson, do trânsito de Vénus para Wagner. Químico de formação, amante da ópera e da fotografia, amante sobretudo da vida. Entre outras coisas, diz que o problema do país é «haver dinheiro a mais». Faz do ensino uma honra, uma vocação. Por vezes despistado, por vezes concentrado, mas sempre dado.
Jorge Calado deu no dia nove de Junho de dois mil e quatro a sua última aula, ao meio-dia, no seu Instituto Superior Técnico.
quarta-feira, junho 09, 2004
Morreu Sousa Franco
«Os que escolheram guiar os outros devem renunciar a todo o poder e a toda a riqueza, não devendo possuir senão o fato que levam vestido, nada mais, nem sequer a comida de amanhã. É assim que se poderá distinguir os sábios dos falsos devotos vendendores de crenças.»
Os Jardins de Luz, Amin Maalouf
a relva é verde
- Acho incrível ter-se feito o Rock in Rio onde se fez.
- Ah, o sítio é lindo.
- Pois,
era...
- Não me gozes, aquele sítio é perfeito para este tipo de coisas. É o ideal para quando o Papa vier cá.
- (Ainda a refazer-me da comparação) Mas o parque da Bela Vista é um
parque, deve ser protegido e mantido...
- Em 2006 estou lá outra vez.
- E lá se vai o parque...
terça-feira, junho 08, 2004
para ti
Só. Ninguém mais saberá. Faz disto o que quiseres. É teu.
Por estes dias
só me apetece continuar a ler as explicações da insónia (de 47), pelo
Ivan.
segunda-feira, junho 07, 2004
Cinemas
A época das grandes salas já acabou (infelizmente). Hoje, ir ao cinema é mais uma actividade de consumo como outra qualquer. Tirando as salas que se demarcam claramente (como o King), o panorama é sofrível. Salas sem ambiente, sem marca, sem impressão. Por isso, espanta que o Corte Inglés tenha conseguido afirmar-se como referência. Não só pela qualidade das salas (evidente), mas também por um ambiente próprio. A rivalizar com a grande superfície (no mainstream da oferta) só temos o Monumental. Na minha opinião. E porquê? Eu reconheço naquelas salas (no "Cine-teatro" especialmente) um modo próprio de mostrar filmes. Mas porquê? Gosto de pensar que isso se deve ao trabalho de
Egas José Vieira e Manuel Graça Dias, que foram capazes, como sempre o fazem, de marcar positivamente um espaço. A que não ficamos indiferentes. Reconheço que não sou inocente. Estou (penso) treinado para olhar. Mas estou convicto que aquela arquitectura, de interior, é o suficientemente forte para gerar ambiente. E que isso contribui para o "sucesso" do Monumental.
Hoje acordei poeta
A questão do imaginário
Penso em coisas apáticas. Brancas, sem cor. Indiferentes a cada olhar, que as tomam por adquiridas, como outra coisa qualquer. Teram sido feitas? ou já lá estão desde sempre, sem que nenhum homem as tenha tocado? Não se sabe.
Peço a quem me poderá ouvir, se fizer o favor, de por algo de si no que fizer. Sempre, dando ouvidos ao impulso inexplicável, ignorando os bons costumes. Tentar a arte, mesmo que se fracasse. Prefiro uma tentaviva fracassada do que uma resignação primitiva. É feio? Mas quem diz? Haverá alguma brigada do bom gosto, por acaso? Logo em Portugal, país onde tudo é regulamentado menos o desenho.
Não há que ter medo. Uma folha em branco não é mais do que uma folha em branco. É nada. Nada à espera de qualquer coisa. No fundo, é a folha em branco que mais deseja ser surpreendida. Mas nós recuamos. E fazemos uns traços conformados, para tristeza da folha em branco. Uma coisa assim consensual, pacífica, pacifista. Sem nada. Como a folha em branco.
E depois tudo isto se transforma numa sucessão de repressões do imaginário que é nosso, mas que não se mostra, envergonhado, como se fosse possível ter vergonha de nós próprios. Ninguém se atreve a dizer: «fiz assim porque gosto», receosos da exposição daquilo que gostamos, como se isso nos abrisse ao desconhecido. O medo do impulso. O medo do não pensado. O medo da emoção.
A folha em branco não é o nosso maior medo; o que lá pomos em cima é bem pior.
domingo, junho 06, 2004
Viabilidade
No passado dia 4, o
Público noticiava:
«O ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação disse ontem que "o Metropolitano de Lisboa está a fazer um estudo de viabilidade de uma ligação em túnel entre a Margueira e Alcântara", um projecto que é "muito entusiasmante" mas que, sublinhou Carmona Rodrigues, terá de ser ainda avaliado.»
Não estou por dentro do processo, mas a notícia é animadora. Quase um milagre, diria. Um dos maiores problemas de Lisboa, e consequentemente da AML, reside no facto de ser uma cidade que se desenvolve em 120º, em vez dos desejáveis 360. Isto gera enúmeras contrariedades, nomeadamente de expansão. Hoje, Lisboa já não é uma simples cidade, mas uma Cidade-Região, como lhe chama Ribeiro Telles. E deve ser pensada como tal. A possibilidade de haver uma ligação por metro das duas margens é algo por que vale a pena fazer esforços. Que a viabilidade em equação seja apenas a técnica, e não a económica. Não hostilizo a engenharia financeira, mas nestes casos o alcance da obra permite todos os cenários. Os meios de transporte é um dos factores mais decisivos para o que se chama por «qualidade de vida». E neste caso trata-se de uma medida estruturante para a AML, ou Cidade-Região Lisboa.
pop
Parece que a Britney não cantou, fez de conta. Portanto, foi uma actuação falsa. O que dirão mais? Que a sua anatomia é falsa? Tenham juízo.
LAC
Espírito crítico
sábado, junho 05, 2004
relações
No artigo de hoje do
Público, Ricardo Carvalho resume, a propósito do projecto do Fórum Barcelona, de uma forma brilhante as relações cliente-projectista-público:
«A equipa de Herzog & de Meuron, ao contrário de todas as expectativas e programa de concurso, propôs um edifício com relações urbanas imprevisíveis, e até de certo modo contrárias àquilo que os responsáveis do plano tinham previsto. Agora tem que se dar tempo aos cidadãos e à cidade para o compreender e integrar no seu quotidiano.»
O que é a arquitectura? (10)
(de Manuel Graça Dias, na crónica de hoje do Expresso)
O papel dos arquitectos deverá ser, a cada momento, o de descobrir e potenciar, na maior ou menor riqueza dos tecidos urbanos, as capacidades escondidas, as hipóteses de regeneração e melhoria ou, pelo menos, as lentas aberturas possíveis e as alterações a propósito dos vários programas a que vão sendo chamados a atribuir significado.
Stupid quiz
Segudo este teste,
http://www.votematch.net/index.htm, concordo principalmente com o GUE/NGL- Confederal Group of the European United Left / Nordic Green Left (onde está o PCP), e com o ELDR - European Liberal and Democratic Reform. Até hoje achava-me moderado.
LAC
sexta-feira, junho 04, 2004
Metallica
Hoje é dia de Metallica no Rock in Rio. Não vou porque já fui, no Jamor em 99, e porque não "arranjei" nenhum bilhete (parece que toda a gente "arranja bilhetes"). Mas não me coíbo de escrever.
Eu não gosto de heavy metal. Os meus amigos acham que sim, porque oiço algumas bandas que se enquadram nessa definição. Mas eu não tenho interesse nenhum por letras negras e furiosas guitarradas, exceptuando quando a qualidade está presente. Isso acontece com supremacia no ajuntamento da California. Lança-se então a suspeita sobre o meu gosto. Devo preferir os Metallica comerciais, ou melódicos. Nada disso. Acho que desde o And Justice for All foi sempre a descer. Aliás, o período 1986-88 é os Metallica: Master of Puppets, And Justice for All. Um com Cliff Burton, outro com Jason Newsted. Os albuns anteriores são verdes (o Kill 'Em All no que à produção diz respeito, o Ride the Lightning no que à criatividade diz respeito); os posteriores reflectem a chegada ao mainstream. Os rapazes têm um novo álbum, marcado pela experiência de James Hetfield na clínica. É agressivo, rápido, cru. E é uma resposta à sua suposta comercialização. Conscientes do que vale, é pouco tocado na actual tour. Mas os Metallica representam boa parte da minha juventude (bom, ainda sou imberbe, mas cresci um bocado). O que não quer dizer que a sua música seja para putos. Nada disso. Os Metallica são a banda de heavy metal que levou o ofício mais a sério. As suas prestações em palco são profissionalíssimas; a sua atitude nunca reflete falta de respeito por ninguém (tratam o público sempre por "friends"). Não são violentos (Kirk Hammett, o guitarrista, é hoje surfista e ouve Reggae), apesar da imagem que se possa projectar. São uns senhores, hoje de quarenta anos. Devo-lhes muito, muitas horas agarrado a uma guitarra. Com o volume sempre muito alto. Porque não se pode ouvir Metallica sem o volume muito alto. Os Metallica são a primeira e última banda de heavy metal. Estimem-nos.
LAC
quinta-feira, junho 03, 2004
Resposta a um «raivoso manifesto»
E o hotmail dá sinais de vida:
«Quanto exagero. "A verdadeira cidade está no guia, é a cidade do guia". Não acredito que algum comprador de guias de viagens (nos quais orgulhosamente me incluo) o pense. O bom guia não existe. O mau sim. O preferido de cada um, seguramente (com excepção daquelas pessoas que escrevem contra eles raivosos manifestos). O meu não pretende esgotar a cidade nas suas poucas dezenas de páginas, apenas sugerir, contar pequenas curiosidades que correm o risco de serem ignoradas. Não espera que o leiam de uma ponta à outra, nem que sigam todos os seus percursos... Não crê que possa revelar-me a alma de um povo e de um país ou teria o seguinte spot publicitário: "Eis tudo o que há para saber sobre este destino. Se ainda assim considerar que tem de lá ir, devolveremos os seu dinheiro". Está escrito de forma escorreita e, preferencialmente, na primeira pessoa. Dá-me vontade de partir o quanto antes, de ver tudo o que aquele viajante viu e tudo aquilo que lhe escapou.
É certo que as informações sobre museus, horários, transportes, mapas não serão desprovidas de utilidade (particularmente os mapas, no meu caso), mas facilmente se descobrem no local. Não é isso o que mais interessa. A mim agradam-me as curiosidades, as lendas e histórias. Ver se batem certo as impressões de um viajante com as dos locais. Raramente me fico pela pouca informação que vem no guia, mas é verdade que me dá muitas "dicas", e agradeço-lhe por isso. Enquanto a nossa relação se mantiver esta, vou continuar a usá-lo.
Jamais pode um guia amputar a uma cidade a capacidade que ela tem de nos surpreender. Parece-me isso tão óbvio.
Já agora. Algo contra mulheres nuas?» (Mariana)
Resposta: Não. Nada contra mulheres nuas.
P.S.: Um dos guias que para aqui andam tem (e vou ser preciso) 432 páginas.
LAC
Abaixo os guias turísticos
Não tenho nenhum trauma, nem mesmo nenhuma razão de queixa. É talvez uma saudade do que nunca vivi. Como foi conhecer cidades? Conhecer verdadeiramente, afogados no desconhecido? Só uma certeza possuo: isso desapareceu. Com a banalização do guia turístico, qual manual de instruções para uma cidade, completíssimo, não deixando que nada escape. Tenho uma aversão a estas coisas. «O guia que lhe mostra o que os outros só contam», avisa um exemplar que para aqui tenho, este sobre Nova Iorque. Mas mostra o quê? Abro. Vejo o índice. O primeiro item é perfeito: «como usar este guia». Não vamos nós perder o norte dentro do guia, que paradoxo insuportável. Depois vem umas xaropadas sobre a «história» da cidade, e uns capítulos «zona por zona». Ah, o mistério da urbe desvenda-se. Eis que chegamos ao centro do ódio: «indicações ao turista». Aqui, o manualista entra em loucura total. Como se não bastasse a tentativa de menosprezar a complexidade da cidade reduzindo-a a esquemas de «fácil» compreensão, qual bom samaritano diz-nos como nos devemos comportar. E onde. E quando. E com quem. Avisa-nos dos «costumes» locais, prevenindo assim o leitor para eventuais descobertas ocasionais. Não, um bom turista é o turista avisado. Nestes guias, é normal lermos: «divirta-se visitando o jardim oriental da cidade, disfrutanto o belo pôr-do-sol às 20.43, debaixo dos plátanos típicos, com uma bela vista sobre a Igreja de S. Cipriano, um belo exemplo da arquitectura da época, enquanto o melro canta por cima do seu ombro esquerdo, com a sua família nas férias merecidas.» E, quando nos estivermos a «divertir visitando o jardim oriental da cidade, disfrutanto o belo pôr-do-sol às 20.43, debaixo dos plátanos típicos, com uma bela vista sobre a Igreja de S. Cipriano, um belo exemplo da arquitectura da época, enquanto o melro canta por cima do seu ombro esquerdo, com a nossa família nas férias merecidas», lembrar-nos-emos do guia, que nos permitiu «divertir visitando o jardim oriental da cidade, disfrutanto o belo pôr-do-sol às 20.43, debaixo dos plátanos típicos, com uma bela vista sobre a Igreja de S. Cipriano, um belo exemplo da arquitectura da época, enquanto o melro canta por cima do seu ombro esquerdo, com a nossa família nas férias merecidas». Onde ficar. Onde comer. O que comer. Quanto pagar. Quando sorrir. Para onde olhar. Por onde andar. Que «monumentos» visitar. Nada é deixado ao acaso. Só a cidade. Essa não interessa. A verdadeira cidade está no guia, é a cidade do guia. Se, por descuido, embarcarmos nalguma actividade não receitada, então o tempo estará a ser obscenamente desperdiçado. «Passeio de 90 minutos por Greenwich Village e SoHo», mostra-me uma página aberta ao acaso. Que reconfortante é saber que em 90 minutos podemos apreender toda a magia do Greenwich Village e do SoHo. Se não fosse o guia arriscar-me-ia a perder, não sei, e arrisco, uns 95 minutos.
Conselho de amigo: não transforme a cidade num consumível. Dê espaço para a surpresa. Não há nada pior do que uma cidade que não surpreende. Uma cidade sem surpresas é como uma mulher nua. Está lá tudo, mas precisávamos de ver tudo?
LAC
Agenda
1.
19H00 - [Colóquios Bibliotecas LX] - Bibliotecas e Arquivos: Espaços de Cidadania e Conhecimento, com a participação de Alexandre Marques Pereira e Souto Moura, moderado por José de Monterroso Teixeira.
Apresentação pública do novo edifício da Biblioteca e Arquivos Central de Lisboa (de Alberto de Souza Oliveira e Manuel Aires Mateus).
Eu vou lá estar.
2. 21H30 - Lançamento da Prototypo #009, com o tema de capa dedicado a «Álvaro Siza, Rafael Moneo». Na Sala do Risco, Lisboa, junto à Sé.
LAC
quarta-feira, junho 02, 2004
é a diferença
Uns escrevem sobre o
OMA,
outros vão lá.
LAC
mafaldinha e jessica
Novo link:
Figuras d'Estilo.
LAC
O ésse de Duchamp
O problema é que ele não existe. Eu pensei que sim. Movido por um impulso infundado, lá o coloquei. Entre o 'u' e o 'c', o 's'. Como em Deutschland, mas ele não é alemão, é francês. E eu com o francês não tenho a melhor das relações. Conhecemo-nos, mas só nos cumprimentamos se for inevitável. Está claro que ninguém ligou. Mas uma gralha é uma gralha é uma gralha. Imperdoável. E logo o 's', uma bela letra, indispensável em qualquer plural que se preze. Plural que dá sentido à vida. Se não fosse o plural, a falta do 's' não interessava a ninguém. O 's' que forma o plural, é desta vez retirado por causa do plural. Singularidades.
LAC
Puro Prazer
A partir de hoje vai dar-se destaque àqueles blogues que, por uma razão ou por outra, são indispensáveis (para esta pessoa). Começa bem. Com a Charlotte, que anda imparável com a série «pormenores», e com a Memória Inventada, recanto de escrita sempre apurada.
LAC
só pode
Nu, descendo umas escadas? Para quê a pressa?
LAC
terça-feira, junho 01, 2004
nota
Mandar o «
Espírito de Kahn» para cima da «
dessacralização» do Koolhaas é muito bem mandado,
Pedro, muito bem mandado. E, já agora, a arquitectura é arte. Pode ser a discussão mais velha do mundo, mas é. Arte.
LAC
adenda
Para se perceber melhor o que quis dizer no último post, explicite-se que nem sou grande fã de Monet. E que a dúvida é muito mais interessante do que a certeza. Pronto.
LAC
nem me atrevo a perguntar «o que é a arte?»
O
Daniel atira-se com unhas e dentes ao João Pereira Coutinho. Devo dizer que não acho JPC
«um idiota». O seu estilo de escrita (porque ele o tem, coisa rara em Portugal) é conhecido. Eu gosto. E o texto que o Daniel cita tem mais do que se lhe diga.
Não alinho nesse ponto de vista que define a arte contemporânea como menor. Quem me conhece sabe bem disso. Costumo inclusive levantar o tema do Impressionismo quando entro nesse tipo de discussões, tentando provar que quem considera que a arte morreu depois de Monet só pode ser pobre de espírito. Mas, e como em tudo, a vanguarda e a contemporeneidade não são valores em si mesmos. Por isso, não posso concordar com o que o Daniel diz:
«Talvez este conservador imberbe tenha de voltar aos livros de onde saíu para compreender que se em 1900 todas as obras de Monet tivessem pegado fogo muitas vozes como a dele se teriam feito sentir, menosprezando e regozijando-se com a sua destruição.» Está bem. Pode ser verdade. Mas não prova absolutamente nada. Continuemos.
Não escondo uma inquetação. Não sei, nem posso saber, até que ponto vai a arte do século XX sobreviver. Sobreviver a essa
«segunda vez», a que JPC alude. O problema está no modo de fruição da própria arte. Qualquer objecto artístico não pode ser plenamente compreendido sem um background cultural. Qualquer. Seja a Gioconda ou o urinol de Duchamp. Mas esta perspectiva implica uma consideração cultural da arte. Uma abordagem racional, estruturada, interessada. Contudo, sabemos bem que a arte se oferece a qualquer um. E que é tão legítimo uma paixão ingénua por uma imagem, uma obsessão pessoal que se reveste de significado, como a análise fria do conhecedor. Em que ficamos? Se um analfabeto chora perante os Nenúfares de Monet, o que dizer?
Muita da arte contemporânea sobrevive e valoriza-se pela actulidade. Pelo que significa neste momento. Pela retórica que lhe está subjacente. Os Nenúfares de Monet superaram essa condição. Será a arte contemporânea capaz de ganhar o seu espaço equivalente na história? E JPC afirma:
«Talvez seja. Mas, com a devida vénia, não sei o que será pior: que uma obra de arte desapareça pela força das chamas ou que desapareça em nós depois de um primeiro olhar.» Talvez tenha razão. O que não é confortável admitir, nem desejável. Mas não excluo a hipótese que o rapaz tenha razão. Será um dia triste, se isso acontecer. Mas a verdade é que eu não quero o Urinol de Duchamp para nada.
LAC
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